Amanhã faz uma semana que estou sem celular. Num rompante, arremessei o aparelho contra o chão. Foi bateria para um lado, capinha para o outro. Mas o danado é resistente e, apesar da queda ter danificado o sistema sonoro do aparelho, incapacitando-o de exercer sua função primeira, ainda é possível mandar e receber mensagens por SMS, Facebook, Twitter, BBM, Whatsapp etc.
Mesmo assim, mesmo danificado, ele não sai do meu lado. Afinal, é despertador, agenda telefônica, RP. Não ter celular é suicídio social. Quem disse que o cão era o melhor amigo do homem, se enganou. No século XXI, o grande companheiro de homens e mulheres, crianças e adolescentes, é o celular. É ele que nos distrai no caminho para o trabalho, seja no ônibus ou no carro, em violação às leis de trânsito; no intervalo da novela, ou durante aquele núcleo chato; na mesa do bar enquanto esperamos o amigo chegar, ou quando a troca de mensagens virtuais torna-se mais interessante que o papo ao vivo e a cores. Parece que o nosso comprometimento é maior com quem está longe, do outro lado de uma tela, do que com quem está bem de frente para nós, do outro lado da mesa. E quando este amigo não está, é ai que o buscamos e passamos sim a nos comunicar com ele por meio de troca de texto.
A intenção ao escrever esse texto nem era falar dos conflitos sociais e da maneira abnormal como nos comportamos diante de um aparelho que foi criado para nos ser útil – e o é, em múltiplas dimensões – e do qual nos tornamos dependentes, quase químicos. Queria me lembrar do tempo quando não havia celular. Quando nossas atitudes não eram interpretadas pela quantidade de vezes que deixávamos o aparelho tocar antes de atender a uma ligação ou deixá-la seguir para a caixa postal. Recusar uma ligação depois que o telefone tocou uma ou duas vezes, nem pensar. Quem está do outro lado imediatamente vai concluir que escolhemos não atender a ligação. Vai levar para o lado pessoal. E as cobranças vão surgir. Pouco importa se aquele filme estava no final ou se um amigo estava nos fazendo uma confidência.
Parece que não podemos viver sem ele. E os outros não admitem que o façamos. Mas ele faz parte de nossas vidas há apenas vinte, quinze anos? O que me incomoda é a obrigação de estar disponível o tempo todo, para os amigos, para a família, para os telemarqueteiros. A sensação da ausência de paz, de que o silêncio pode ser interrompido a qualquer instante por uma vibração ou toque estrondoso.
Criamos a tecnologia para facilitar a nossa vida e, de repente, nos vemos escravos dela. Tive o meu primeiro celular já na faculdade, aos 17 anos. Um Nokia tijolão, com tela de fundo verde. A maior utilidade para mim? O jogo da cobrinha... Não conseguia nem mandar mensagem de texto. Eu era muito mais educada e dava muito mais atenção aos meus amigos.
Vitória X Democracia
Há 14 anos