Saudade. A língua portuguesa se vangloria de ser uma das poucas que possui uma palavra para expressar esse sentimento profundo de nostalgia, melancolia e, às vezes, de pesar. A palavra saudade descreve os sentimentos mais intensos que se originam no nosso íntimo e se relacionam com nosso presente, passado e futuro. A música, a poesia e a literatura sabem e o souberam utilizá-la através de seus versos mais belos.
Nós brasileiros, no entanto, ao invés de preservá-la, abusamos da riqueza do nosso vocabulário e rebaixamos “saudade” ao uso corriqueiro e banal. Fazemos com “saudade” o mesmo que os norte-americanos (digo-o apenas por minha experiência) fizeram com “I love you”, frase mais usada para despedir-se ao telefone do que como declaração de verdadeiro amor, qualquer que seja sua classificação.
Alguns vão me julgar fria e insensível. A verdade é que creio haver uma diferença entre sentir saudade e sentir falta, e nem todos parecem fazer essa distinção. Sinto falta de minha mãe, de meu pai, de minha família, de meus amigos e de todos aqueles a quem quero bem. Essa falta, no entanto, não me desce ao coração enquanto saiba que todos estão bem e felizes.
Saudade é um sentimento mais especial, único. Sinto saudade do tempo que não volta atrás. Saudade do que nunca vai se realizar no futuro. Saudade do que a morte e a distância impedem que se realize no presente. Tenho saudades de minha vó, de seu cheiro, que após seis anos começa a me escapar à memória, de seus abraços, de seu sorriso contagiante. E creiam-me, poderia passar aqui muitas horas descrevendo quantas saudades sinto dessa velha!
Sinto saudades... De ser acordada por minha mãe quando cantava “tá na hora, vumbora”, ou quando nos acordava às seis da manhã com um copo do nutritivo suco beterraba+cenoura+laranja. Da primeira vez que fui a um jogo de futebol com meu pai. De morar ao lado de meus primos, da época em que éramos melhores amigos e de todos os momentos que compartilhamos juntos. Do arroz com macarrão de minha bisa. De assaltar o armário de chocolates na casa de minha vó Carmen. De ver minha priminha abrir seus olhinhos e sorrir ao ver-me ao seu lado. Dos carnavais na Gamboa. De andar despreocupada pelas ruas de Paris. Já sinto saudade até dos sábados em Busca Vida.
São coisas que não voltam, mas que estarão sempre vivas e presentes dentro de mim enquanto eu sentir saudade. Como sabiamente disse o poeta Neruda, "saudade é sentir que existe o que não existe mais".
Vitória X Democracia
Há 14 anos